Em abril, passei 3 dias em Amsterdam para um encontro de Festivais. É o começo de u   ma viagem de 20 dias. Ainda passo por Cabo Verde e Áustria.

Um projeto estranho e mal organizado. Foi apresentado aos produtores como um congresso de Festivais de Música – e na verdade era principalmente de cinema. Não é comum este tipo de evento – e também não percebermos antes – (este “nós” a que me refiro é um grupo de festivais, principalmente, mas não só, europeus que mantém uma troca constante de informações).

Assim que escapei o mais rápido que pude e fui dar umas voltas em Amsterdam. Viraram dias de quase ferias – os primeiros dias de sol, depois de meses de muito frio na cidade. Assim peguei todos com muito bom humor, e de certa forma felizes. Encontro também amigos locais, um músico e produtor brasileiro que vive agora por aqui, o Marcos Souza. Sempre animado, apeasar das dificuldades naturais de uma nova vida na Europa, especialmente nestes dias, como mencionei acima, de dificuldades econômicas. Está sempre buscando desenvolver diferentes projetos, é daqueles que sempre parecem disponíveis e desejosos de ajudar qualquer músico brasileiro.

A noite, vou a Bimhuiss, uma casa de jazz com uma vista incrível da cidade. Música experimental, algo paradoxalmente comum na Europa, feita por bons instrumentistas. Mas que de alguma forma não reverbera. E não fica na memória.

Agora viajo para Cabo Verde- pasando primeiro por Lisboa. E ao do lado de dois portugueses, um operario de construção, obrigado pelas questões econômicas a viver e trabalhar em Amsterdam. Volta a cada três meses para rever a mulher e dois filhos. Deve ter uns 35 anos. Diz que não consegue sobreviver em Portugal. Triste e preocupado com o seu futuro e de sua família, e ao mesmo tempo, calibrado com alguns goles, se diverte com seus amigos e conversa com a executiva simpática que viaja do nosso lado. A vida é também feita de encontros…

Cabo Verde

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(em quem voce  confia..em crioulo)

Na chegada, algumas surpresas. Descemos do avião, como acontecia até há pouco no aeroporto Santos Dumont do Rio: caminhando pela pista. É sem dúvida o melhor jeito de desembarcar, em qualquer país tropical.

A cidade Praia, capital do país, que compreende várias ilhas, lembra na sua arquitetura uma das várias cidades do interior do Brasil; e em outros momentos, Salvador ou São Luis.
Me sinto no Brasil

Vim para dar uma oficina de produção e algo como uma vivência para músicos locais. Troca de informação e uma certa inquietação. Afora os projetos mais conhecidos como Cesária Évora e mais recentemente, Mayra Andrade, parece haver uma certa desolação e um clima de descontentamento com o cenário e as possibilidades locais.

Mas como em todas as periferias, incluindo várias regiões brasileiras, é mais uma questão de se sentir fora dos grandes centros, como que esquecidos pelos holofotes do mundo.

Ponto para movimentos como fora do eixo, que vem revertendo este olhar, e transformando uma possível desvantagem, em oportunidade.

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De qualquer forma há o desejo de transformação e ampliação da cena por aqui. Se persistirem, poderão criar boas coisas. Curiosamente para nossas expectativas em relação à África, não se faz som nas ruas. Nem nos bares.

Muito bom falar portugues em outro país. E la também se fala o criolo – uma mistura de português, inglês, francês, e sabe lá o que mais. É bonita a lingua, o som…

O Festival, Kriol Jazz, acontece em uma praça. São 8 shows – músicos da África, dos Estados Unidos…

E do Brasil o Cello Samba Trio do Jaques Morelembaum, Lula Galvão e Rafael Barata. Ótimos músicos – e um repertório clássico. Tom Jobim, Dorival Caymmi, Egberto Gismonti, João Donato. O público reage bem.

Manhatan Transfer dos EUA me faz pensar na questão do tempo. Cantam muito bem, mas parece que estou na era da disco-glitter, algo assim. Um pouco fora do tempo, para mim.

O som mais surpreendente que vi – foi um projeto da África do Sul – Tumi and the Volume www.myspace.com/tatv. Um quarteto que inclue dois músicos de Moçambique que fazem hip-hop com – guitarra baixo e bateria. Ótimos músicos – especialmente guitarra e bateria. É bacana, porque rolaram boas idéias músicais, ótimos grooves. E o Tumi é um bom rapper.

Em um restaurante a noite, um tecladista toca música brasileira – Tico-tico no fubá, e outras. Às vezes inesperadamente bem. E às vezes bem mal…

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No domingo entro em uma igreja lotada. E sou surpreendido por um canto coral muito bonito e tocante, acompanhados por percussão. Muito africano e musical. Ouço depois falar nos rebelados – habitantes da ilha, que se afastaram de uma certa opressão da igreja européia e criaram seu próprio caminho… e sua própria igreja.

Passo algumas horas conversando com diretores de outros festivais na África – Gabão, Burkina Faso, Ilha da Reunião. E também da Jamaica. E com o guitarrista moçambicano do grupo acima. São todos muito bem informados, conectados, atentos. O que só reforça o desejo de conhecer mais o continente.

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